O ex-delegado seccional de Assis, Newton de Calasans Júnior, hoje aposentado da Polícia Civil, foi condenado pelo crime de importunação sexual contra duas servidoras. O Estado de São Paulo também foi condenado a pagar a indenização solidariamente. Cada servidora deve receber R$ 1 milhão.
Calazans comandou a Delegacia Seccional de Assis por sete anos e seis meses, até outubro de 2019, quando deixou o o cargo para se aposentar. Em setembro de 2017, ele anunciou a construção da nova Delegacia de Polícia Civil de Palmital, que foi entregue em 2020.
O que aconteceu
Os casos de importunação sexual ocorreram entre 2014 e 2019 em uma delegacia em Assis.
O juiz determinou que as vítimas recebam indenizações de R$ 1 milhão cada. Também devem ter despesas médicas de tratamento psicológico e psiquiátrico cobertas.
A indenização deve ser paga pelo delegado e pelo Estado de São Paulo. A sentença não definiu como será feita a divisão do pagamento.
Sentença cita beijo na boca sem consentimento e toque em seios e nádegas. O delegado abraçou e beijou uma das vítimas na boca sem o seu consentimento. Também tocou nos seios e nas nádegas das servidoras.
O delegado ainda fez ameaças caso fosse denunciado. “[Em mensagem por WhatsApp, ele disse que era melhor] ela não falar com ninguém”, diz a denúncia.
Sentença cita ambiente hostil na delegacia após a denúncia. As servidoras chegaram a ter os pneus dos seus carros esvaziados no estacionamento da unidade policial por colegas, o que evidencia, segundo a sentença, “a inversão de valores” em um ambiente de trabalho que “deveria zelar pelo cumprimento da lei”.
Procurada, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) informou que, independentemente da natureza da ação, a Polícia Civil não compactua com qualquer tipo de desvio dos seus agentes e reforça que a Corregedoria da instituição está aberta para investigar denúncias de eventuais crimes cometidos por seus agentes.
É importante ressaltar que na formação inicial dos novos policiais civis do Estado de São Paulo foi inserida a disciplina Ética Policial visando aprimorar os valores da instituição, ressaltar a importância do respeito que deve haver entre os agentes de segurança pública e aperfeiçoar os serviços que os policiais prestam à população. Secretaria de Segurança Pública de São Paulo
Em nota, a PGE-SP (Procuradoria Geral do Estado de São Paulo) informou que não foi intimada da decisão.
O que diz a sentença
Em abuso de sua posição hierárquica, o réu sugeriu favores sexuais em troca de sua aprovação no estágio probatório para que ela [uma das vítimas] fosse efetivada como servidora pública.
Frases ao estilo “quero saber qual das três vai dar para mim primeiro” ilustram a torpeza do seu comportamento, a violação de padrões mínimos de comportamento ético a serem esperados de servidor público, principalmente de quem ocupava cargo de tamanha responsabilidade social, como o é a função de delegado de polícia.
Numa agência bancária, o réu cumprimentou a vítima descansando a mão no seu quadril e sugeriu que era “(…) só tirar a roupa” porque estaria transpirando demais.
Por longo tempo, pérfidas investidas sexuais, crime de importunação sexual, comportamentos distintos e intermitentes, acarretaram às autoras inequívoco trauma que justifica a reparação no valor pretendido, R$ 1 milhão para cada qual, em razão da proporção de tempo e profundidade envolvendo o corréu e o hostil ambiente de trabalho. Trechos da sentença da 3ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo
O que dizem as vítimas
Ao UOL, uma das vítimas afirmou que Calasans Junior tocava os corpos das mulheres “inapropriadamente” ao cumprimentá-las com abraços. “Ele dava beijo babado, era sempre muito estranho esse contato com ele”, declarou.
A segunda vítima de Calasans Junior contou que, após denunciar o delegado, enfrentou represálias. Comentários maldosos percorriam os corredores da delegacia, vindos especialmente de outros policiais homens, que afirmavam que a denúncia não daria em nada e que elas ficariam marcadas na Seccional.
As piores escalas de plantão eram destinadas às denunciantes. Elas também eram alocadas para cobrir férias de colegas de outras cidades da Seccional.
Os carros das denunciantes foram vandalizados no estacionamento da delegacia. Tiveram pneus esvaziados, lataria riscada e retrovisores quebrados. Segundo a vítima, as câmeras de segurança não estavam operando nesses dias, “curiosamente”.
Nesses abraços que ele dava [nas mulheres] sempre aproveitava para bater a mão, esbarrava a mão no peito, esbarrava a mão na bunda. E eu sempre me sentia muito invadida. Primeira vítima do delegado
Não sei se voltarei a ter a mesma capacidade laborativa um dia. Ainda me sinto mal quando penso que tem mulheres passando pelo que passei. Nesse momento, não tenho saúde para ajudá-las, mas vou fazer de tudo para me curar e voltar para onde eu amo trabalhar. Segunda vítima do delegado
Fonte: Herculano Barreto Filho/UOL