É possível se recuperar de um caso? A resposta para a maioria dos casais é sim
Lílian e Mateus estavam juntos há 20 anos e eram os pais de Lola, com treze anos, e Isabel, com cinco aninhos. A vida era basicamente: escola, escolinha, trabalho, inglês da mais velha, pediatra, parquinho, mais trabalho e a administração da casa. Nenhum dos dois fazia do casamento uma prioridade, porque, afinal, quem consegue? Facilmente se esqueciam até mesmo de fazer amor, cansados, desestimulados, mas fora isso, sem queixas de ambos os lados, em uma análise superficial, o casamento era bom e sólido, nenhum dos dois tinha dúvidas quanto a isso.
Mas repentinamente tudo mudou, com o comportamento de Mateus se modificando dia a dia. Escapadas na noite, depois do trabalho, o tempo no celular, preferencialmente longe das vistas da esposa e não demorou para que Lilian percebesse. Ela perguntou algumas vezes se estava tudo bem e ele sempre respondia que sim, que estava atualizando algum assunto, checando notícias, embora depois de um tempo repetindo a mesma pergunta, ele começasse a reagir mal e a responder atravessado.
Ela confiava nele e traição não passava pela sua cabeça.
Talvez até mesmo por isso, ao se deparar com o fato consumado, já não havia dúvidas de que seu marido estava envolvido com outra mulher, o baque tenha sido tão grande, ela ficou arrasada. Seu mundo desabou. Sentia-se idiota porque nesses anos todos de casamento jamais imaginou que pudesse ser traída, sua confiança no marido era absoluta.
No começo, Mateus tentou negar, mas as evidências foram se tornando mais fortes a cada dia e era como tentar cobrir os raios do sol com uma peneira. Sua tentativa de ocultar o caso, era para tentar proteger sua esposa contra a decepção que ele sabia que aconteceria. Mas, conforme mais evidências surgiam, ele não conseguia mais mentir. Ele estava tendo um caso.
E ele nem sequer conseguia explicar como isso tudo tinha tomado essa enorme dimensão, também ele, jamais havia pensado que trairia sua esposa, simplesmente aconteceu. Ela era nova no escritório, com seus enormes olhos verdes e um fino humor que o conquistou. No início era apenas amizade, ele estava ávido por outros assuntos que não fossem o universo de uma pré-adolescente e uma criança de cinco anos, empregadas, a feira, os preços, a escola… Ele precisava de outros assuntos, risadas, enfim, relaxar. E principalmente, alguém que o escutasse e o fizesse sentir-se especial.
Durante o caso, ele acabou por se convencer que Lilian não se importava com ele nem o amava mais, que haviam se transformado em parceiros de uma empresa chamada casa & filhos. Uma tentativa até de se proteger contra o peso do que estava fazendo com ela, um ato que ele sempre considerou canalha, quando ouvia relatos de outros casais.
Enfim, analisando a situação, não somente ela estava sofrendo ao constatar a traição, ele também sofria e há muito mais tempo. Mas um caso não precisa determinar o fim da relação, é difícil, complicado mas dá para resgatar.
Analisando o mapa de um caso:
O parceiro traído experimenta uma onda de emoção. A dor, a mágoa, a raiva, a humilhação e o desespero são avassaladores. E mesmo quando há o resgate, com tudo voltando ao normal, o parceiro traído, não consegue relaxar (nem confiar), vigilante, ele espera a qualquer momento um novo golpe…
Sua mente absorve o que sabe, cria o que não sabe, projeta futuros sombrios, imagina cenas românticas entre seu parceiro e a outra pessoa, o turbilhão parece não ter fim e o sofrimento é grande.
A Culpa da Traição
O traidor também experimenta uma grande quantidade de emoção. O sentimento desesperador de testemunhar seu parceiro sofrendo e saber que você não pode fazer nada para aliviar o sofrimento dele é uma experiência horrível. Os sentimentos de culpa, vergonha e humilhação são insuportáveis.
Então, o que causa um caso? Por que os parceiros escolhem trair? E como vocês ficam juntos depois da infidelidade? As respostas são complicadas e podem levar meses para serem desvendadas.
Recuperando-se de um caso:
É possível se recuperar de um caso? A resposta para a maioria dos casais é sim. Durante todos esses anos, lidando com casais, ouvi muitas confissões, desabafos e um fato se repete: a maioria após passar o pesadelo acaba por concordar que a relação ficou melhor que antes. No entanto, isso não acontece de um dia para o outro, como qualquer grande ferimento, o tempo de cicatrização pode ser longo. Se torna mais fácil quando ambos podem e aceitam fazer terapia.
Consola saber que na maioria das vezes o tempo se encarrega de amenizar a dor e colocar aos poucos tudo nos seus lugares, eu disse na maioria das vezes, não na sua totalidade, porque para alguns casais, a ruptura é inevitável, com o parceiro traído odiando visceralmente o traidor. E mesmo com a terapia, o máximo que o profissional consegue é ajudar aos dois a entender o que os levou até ali e vislumbrar o que desejam de fato para o futuro.
O parceiro traído precisa ter suas perguntas respondidas, como:
Quando vocês se conheceram?
Onde vocês se conheceram?
Quanto tempo durou o caso?
O parceiro traído tenta entender como isso aconteceu e como pode evitar que aconteça novamente. Eles também buscam consistência nas histórias de uma narrativa para a outra. Eu sei de tudo? Você está mentindo para mim agora? Essas perguntas são melhor feitas e respondidas no ambiente emocionalmente seguro do consultório de um terapeuta.
Se bem que é melhor não fazer perguntas sobre os detalhes da natureza do caso. Essas perguntas geralmente fazem mais mal do que bem, pois evocam imagens que podem assombrar os pensamentos do parceiro traído.
Quando o parceiro traído sente que tem todas as respostas de que precisa, o casal pode começar a trabalhar na reconstrução da confiança. Casais como Lilian e Mateus se afastaram um do outro de muitas maneiras ao longo do tempo, o que se soma aos sentimentos que, no final, levaram Mateus a trair. Eles negligenciaram o relacionamento e esse conhecimento e aceitação por parte de Lilian ameniza um pouco os conflitos e abre uma nesga na cortina de um futuro (ainda) juntos.
Uma vez que os casais processam o que aconteceu, eles precisam começar a se sintonizar novamente um com o outro. Lilian e Mateus descobriram que evitavam um ao outro para evitar conflitos na maioria das vezes, além da sobrecarga familiar. Sintonizar novamente requer diálogo sobre problemas — tanto problemas perpétuos em andamento quanto questões passadas que podem ter causado algum dano ao relacionamento.
Reconheça que o conflito é inevitável.
O conflito é uma parte natural da vida e no relacionamento amoroso não seria diferente. Todo relacionamento tem conflito devido a diferentes valores, crenças e filosofias de vida. Quando essas diferenças são discutidas com segurança, e quando honradas e respeitadas, o casal experimentará maior intimidade.
Às vezes, isso pode parecer desconfortável e exigir um pouco de adequação com ambos cedendo um pouco. A interferência de um terapeuta experiente nestas questões podem deixar os diálogos mais confortáveis e assertivos.
Uma vez que o casal tenha se sintonizado novamente, será útil criar alguns rituais significativos para permanecerem conectados. Os casais podem ser criativos sobre maneiras de fazer aquilo que é especial e único para eles.
Talvez perder mais alguns minutinhos pela manhã e tomar café juntos, programar seus horários para poderem jantar em família, momento mais que especial para que todos os membros da família possam se comunicar. E é claro, tirar um tempo para juntos reconstruírem a intimidade, tempo no quarto à dois, passeios e “fugas” juntos, para colocar realmente a relação nos eixos.
Traições emocionais são um golpe forte para um relacionamento, mas um caso não precisa ser o fim. Casais que têm a fortaleza emocional para estender a mão e buscar a ajuda de que precisam podem criar um relacionamento muito mais significativo e íntimo após a infidelidade.
Fonte: Extra