A MÃE QUE NOS PARIU

Parir: verbo transitivo direto, sem intermediários, de ligação indissociável entre a parturiente e sua cria, a mãe e sua criança… Parir: ato de dar a vida, gerar, produzir. Parir: ação única e exclusiva da maternidade, seja esta humana ou animal… Parir: dar à luz. Então, é menos indigna aquela que, por circunstâncias adversas do meio social, são escorchadas pelo ato de um parto em desconformidade com nossos padrões morais? Quem te pariu que te embale. Que juízo esse nosso; que culpa tem a mãe do juiz?

Julgamos conforme nossas leis pessoais. Ainda não somos filhos de chocadeiras, mas bem o poderíamos ser. Seria menos cruel nossa relação filial, pois estaríamos livres de sentimentos e obrigações. Temo que isso ainda se torne realidade. Já pensou ser gerado mecanicamente, num laboratório frio, longe de qualquer afago, de qualquer carinho ou expectativa familiar? Não me surpreenderia se ouvisse hoje tal notícia: Nasce a primeira criança filha de chocadeira. Tudo nela seria construído opcionalmente pelos pretensos pais: a cor dos olhos, dos cabelos, formato do rosto, tipo estrutural, pele, sexo… Seus dotes cerebrais viriam de reservas dos maiores gênios cujos DNAs ainda sobreviveram à audácia da morte… Sim, porque morrer seria uma tragédia só circunscrita à linha da pobreza plebeia. Nada de vínculo familiar, utópico, superado pelas novas tecnologias. Tudo nesta criança seria perfeito, escolhido a dedo, como hoje escolhemos os bens de consumo numa gôndola qualquer.

Criança, bem de consumo! Puta que nos pariu, essa sociedade sem veias e sem peias… Em termos, é exatamente isso o que vemos acontecer nas famílias desestruturadas dos nossos dias. A maternidade raramente é bem vista pela grande maioria das mulheres de hoje. Quase sempre é um estorvo em suas vidas. Quando muito, aceita-se esse “sacrifício” em função de uma continuidade racional dos espólios familiares. Interesses empresariais, culturais e até patriarcais entram nesse jogo de vida e morte. Vivemos uma tragédia domestica sem precedentes, que bem justifica a assustadora taxa de suicídios entre muitos dos nossos jovens, hoje aumentada em mais de duzentos por cento. Muitos dos grandes dilemas da estrutura familiar são diagnosticados como ausência de interação entre seus membros, em especial o enfraquecimento da figura maternal. Mãe já não é aquela que gera, como pai não mais aquele que cria… Há uma dissonância nessas definições outrora vitais, hoje adaptáveis às circunstâncias e carências de uma infância sem muitas expectativas de estabilidade familiar. Onde os pais, a mãe dileta e afetuosa de outrora? Sabemos o quão raros hoje são.

Não posso vender a ideia conformista do caos em palavras onde reafirmo a esperança. Há sempre uma luz em meio às trevas. Estas nos apontam o caminho, a saída. A maternidade será sempre uma bênção para a mulher que nela enxerga a ação criadora de Deus. “Bendito o fruto do seu ventre”, nunca maldito… Tão bendito que Cristo, o Verbo de Deus, fez-se carne, tornou-se filho no ventre santo de uma Eva (mãe) por excelência e assim nos deu nova oportunidade de remissão. Não só isso, mas repartiu conosco o privilégio de ser Filho de quem foi: “Eis aí tua mãe!” (Jo 19,27).

Deus abençoe a mãe que nos pariu! Com certeza, ela não se esquece dos filhos que teve. Com certeza, ela não! Mas, se porventura você se sente fora desse ninho, eis uma palavra de consolo: “Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamentou? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu não te esqueceria nunca”, diz o Senhor (Is 49,15). (Is 49,15).

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Cláudio Pissolito

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