Com hospitais lotados, moradores morreram nas unidades de emergência do município, enquanto aguardavam para receber um atendimento especializado.
Ao menos 71 pessoas morreram na fila de espera por um leito hospitalar neste ano em Bauru, informou o Departamento de Emergência e Unidades de Pronto Atendimento da cidade à equipe de reportagem da TV TEM. Quase 65% dessas mortes foram registradas somente no primeiro trimestre de 2024.
A família do bauruense Maurílio Vieira do Nascimento, de 55 anos, foi uma das que precisaram lidar com a dor de se perder um ente querido durante o aguardo pela transferência para um hospital.
De acordo com o filho dele, Maurílio Silva do Nascimento, no dia 16 de maio, o pai, que era paciente renal, procurou a Unidade de Pronto Atendimento do Mary Dota com muita dor no peito.
“Ele deu entrada na unidade por volta das 8h30. Os médicos fizeram um eletrocardiograma e disseram que precisavam transferi-lo para o Hospital de Base. Às 15h25, ainda na UPA, ele faleceu”, conta Maurílio.
As mortes, registradas nas unidades de emergência de Bauru, são consequência de um sistema público de saúde que ainda não é capaz de atender toda a demanda existente.
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP), existem mais de seiscentos leitos hospitalares na cidade, sendo cerca de 110 de UTI. Mas o problema, segundo a diretora do Departamento de Urgência e UPAS de Bauru, Ana Paula Merli, é que esses leitos ficam à disposição dos moradores de todos os municípios pertencentes ao Departamento Regional de Saúde de Bauru.
A transferência desses pacientes acontece por meio da Central de Regulação de Ofertas e Serviços de Saúde (CROSS), setor que administra os atendimentos médicos no estado.
“Os hospitais de Bauru não são somente da cidade. São de uma DRS com 68 municípios. Esses municípios também encaminham pacientes via CROSS para o hospital”, explica Ana Paula.
Sem um hospital municipal e com uma alta demanda regional nas unidades estaduais, a liberação de uma vaga para um leito hospitalar dos bauruenses acaba não tendo um prazo determinado. Segundo a diretora, os pacientes ficam, em média, de 3 a 5 dias na fila.
“Depende da especialidade. Se é um politrauma grave, o Hospital de Base já puxa direto. Dependendo da gravidade do paciente, ele fica aguardando a liberação de leito”, informa.
Via judicial
A forma que os moradores muita vezes encontram para tentar acelerar o processo e evitar a morte do familiar na unidade de emergência é acionar a Justiça. Segundo o presidente da Comissão de Saúde Pública, da OAB de Bauru, Carlos Alexandre de Carvalho, a procura pela ajuda de advogados em condições como essa é gigante.
“São dezenas de medidas judiciais ao longo do mês. A população sabe que se ficar aguardando em leito de UPA, vai perder o ente querido. Procura, então, o judiciário, que responde rápido. Mas nem sempre a ordem é cumprida de imediato, já que não há vaga disponível”, explica.
Durante o período de calamidade na saúde pública causada pelo coronavírus, quando muitas mortes na fila por uma vaga de UTI vieram à tona na cidade, acreditava-se que a abertura do Hospital das Clínicas resolveria o problema da superlotação dos hospitais, já que novos leitos seriam disponibilizados.
Porém, a continuidade das mortes durante a espera pela internação mostram que os esforços do poder público em criar novos leitos não foram suficientes.
Na visão do presidente da Comissão de Saúde, para resolver o problema, é preciso, na verdade, que as autoridades discutam medidas para evitar que os moradores atinjam um quadro clínico em que a internação seja necessária.
“Precisamos tratar a consequência da superlotação. Esse tratamento vai ser como: vamos investir em um Programa de Saúde da Família, vamos ampliar o quadro de profissionais dos postos de saúde. Porque, às vezes, a pessoa tem um tratamento simples, barato para o sistema, só que ela acaba não tendo todo esse suporte. Aí a doença se agrava, ela vai para uma UPA e não tem leito suficiente para internação”, explica.
O que diz a Secretaria de Estado da Saúde?
Questionada sobre as mortes na fila de espera por um leito hospitalar, a SES-SP informou, em nota, que busca unificar as filas da CROSS para ampliar os atendimentos e reduzir a demanda de espera. Informou também que, desde o primeiro dia do novo governo, a pasta vem atuando com a perspectiva da implantação de filas únicas regionais e publicizadas.
Até esta domingo (23), 56 pessoas aguardam por uma internação em Bauru, segundo o Portal de Transparência do município.
Fonte: G1