Em 1986, o cometa Halley fez sua mais recente passagem pela Terra, e se tornou um dos assuntos mais comentados ao redor do mundo.
Todos esperavam pelo espetáculo cósmico com grandes expectativas, e o corpo celeste ganhou até mesmo um super-herói de quadrinhos, um grande sucesso na época que deu início a uma verdadeira “halleymania” no Brasil.
Mas nem sempre foi assim. Em 1910, por exemplo, o cometa Halley causou um caso de histeria que deixou muitos civis — e até mesmo alguns astrônomos — preocupadíssimos com as consequências do evento.
Naquela época, se falava muito sobre os terríveis danos que o cometa causaria ao nosso planeta e a nós, seus habitantes
A data marcada para a passagem cósmica era abril de 1910, mas as notícias sobre o evento começaram a circular em setembro de 1909.
Não era uma previsão difícil de se fazer, já que a órbita foi corretamente calculada em 1705 por Edmond Halley (daí o nome do cometa), que também conseguiu prever corretamente o tempo que o objeto levaria para voltar ao nosso bairro cósmico.
Em 1910, a ciência já estava avançada o suficiente para fotografar o cometa e analisar dados de espectroscopia. Mas isso não foi o suficiente para afastar as crenças infundadas e o pânico generalizado.
Em maio, a Terra passaria pela própria cauda do cometa, e já havia sido descoberto que na cauda havia um gás tóxico chamado cianogênio.
Isso levou o astrônomo Camille Flammarion a afirmar que, quando a Terra passasse pela cauda, o gás “impregnaria a atmosfera e possivelmente acabaria com toda a vida do planeta”.
Além de pouco fundamentado, o pronunciamento alarmista levou muitas pessoas ao pânico. Os que souberam aproveitar a situação venderam máscaras de gás, “pílulas anti-cometa” e “guarda-chuvas anti-cometa.
Outros astrônomos tentavam tranquilizar as pessoas, confirmando que o gás era tão difuso que o mundo não estava correndo risco algum.
Mas, como provavelmente você já deve ter reparado, uma vez que uma “fake news” alarmista se espalha, é muito difícil reverter a situação
Uma reportagem mais recente da Folha relata a história da alemã Olga Hallenberg, que na época tinha 10 anos. “Lá no céu estava aquele enorme cometa, com sua longa cauda, que varreria nosso planeta.
Dizia-se que seus gases mortais devastariam a Terra e a pele das pessoas seria simplesmente dissolvida. Meu pai nos tranquilizou, dizendo que, se isso seria a morte, ao menos morreríamos todos juntos!”.
Na China, o pânico veio bem às vésperas da Revolução Xinhai, que findaria a última dinastia em 1911. De acordo com James Hutson, um missionário na província de Sichuan na época, as pessoas acreditavam que a passagem do cometa indicava calamidades, “como guerra, fogo, pestilência e uma mudança de dinastia.
Em alguns lugares, em determinados dias, as portas foram fechadas por meio dia, nenhuma água foi transportada e muitos nem sequer bebiam água, pois havia rumores de que vapor pestilencial estava sendo derramado sobre a terra pelo cometa”.
A relação da humanidade com os cometas nos séculos anteriores também era de medo e histórias apocalípticas, e isso não é de se estranhar em uma época quando a humanidade costumava associar fenômenos naturais com divindades e criaturas místicas.
Entretanto, é sempre algo interessante para se refletir a forma como a histeria se estabelece mesmo em épocas mais esclarecidas, quando a ciência já é capaz de explicar uma grande parte dos eventos.