Empresário morto após peeling de fenol foi filmado durante procedimento em clínica de estética em São Paulo

Marcelo Camargo, que registrou Henrique Chagas durante o tratamento, conversou com a imprensa. As imagens mostram o paciente com cortes no rosto feitos por uma funcionária e pela dona da clínica. Natalia Becker responde por homicídio por dolo eventual. A perícia está investigando a causa da morte.

Marcelo Camargo, namorado de Henrique da Silva Chagas, que faleceu após se submeter a um peeling de fenol, filmou e tirou fotos do paciente antes, durante e depois do procedimento na clínica de estética de Natalia Becker na Zona Sul de São Paulo.

As imagens, gravadas por celular no dia 3 de junho, mostram Henrique sendo preparado por uma funcionária do consultório. Nelas, a mulher aparece passando um instrumento pontiagudo com uma lâmina no rosto dele. Em outras cenas é possível ver as bochechas do empresário com cortes e sangrando antes da aplicação do fenol.

Em entrevista, Marcelo disse que após a funcionária cortar o rosto de Henrique, ela passou um anestésico tópico, e, em seguida, Natalia continuou os cortes.

“É tipo uma lança, como se fosse uma ponta de agulha, e ela ia rabiscando, ferindo mesmo. Ficou o rosto inteiro bem ferido, bem machucado”, contou ele, que tem 49 anos e trabalha como administrador de empresas e mora em Campinas, interior paulista.

Henrique morava em Pirassununga, também no interior do estado. Ele tinha 27 anos e era dono de um pet shop. Os dois namoravam há três anos e se dividiam entre as casas nas duas cidades.

Apesar dos cortes na face do empresário, Marcelo e o namorado acharam que o procedimento estava seguindo de maneira correta, pois Natalia, segundo o administrador, havia tranquilizado eles e dito que aquilo era normal para preparar a pele para o fenol.

“Não questionamos porque achamos que fazia parte do procedimento”, explicou Marcelo. Depois ele parou de gravar e foi orientado a ficar do lado de fora da sala onde o procedimento foi feito. Foram dez minutos de cortes no rosto e mais 40 minutos de aplicação do fenol.

Henrique pagou R$ 5 mil pelo tratamento. Marcelo contou que após o procedimento, seu namorado estava sentado na maca: “Conversei bastante com ele. Ele só disse que sentiu muita dor, muita queimação, muita ardência, bem forte mesmo. Mas que ele estava suportando por ser o sonho dele.” O empresário se queixava de marcas de acne que adquiriu na adolescência.

Segundo os advogados que defendem os interesses do namorado de Henrique e da mãe do paciente morto, o procedimento de cortar o rosto para aplicar o produto não é adotado pelos especialistas que eles consultaram.

“Conversando com um profissional da área, já verificamos que aqueles cortes no rosto não poderiam ter sido feitos para se aplicar um ácido fortíssimo como é o fenol”, afirmou a advogada Elaine de Cassia Colicigno.

Procurada pela TV Globo, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não seria possível analisar o procedimento feito pela clínica de Natalia somente se baseando nos vídeos e fotos divulgados pela reportagem.

Tanto o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) quanto a Associação Nacional dos Esteticistas e Cosmetólogos (Anesco) informaram que procedimentos com o uso do fenol devem ser realizados exclusivamente por médicos ou profissionais devidamente capacitados e regulamentados. A avaliação deles é de que o procedimento é invasivo e os medicamentos usados podem causar taquicardia.

Apesar de se apresentar como esteticista, Natália não tinha graduação em estética nem era médica.

A Prefeitura de São Paulo fechou a Studio Natalia Becker por tempo indeterminado após a morte de Henrique e as denúncias de que a clínica realizava procedimentos estéticos sem autorização.

A dona do estabelecimento foi indiciada pela Polícia Civil de São Paulo por homicídio doloso por dolo eventual, quando se assume o risco de matar. Ela responde ao crime em liberdade. A gravação de como foi o peeling de fenol em Henrique será entregue pelos advogados de Marcelo para a investigação analisar.

O 27º Distrito Policial (DP), Campo Belo, que investiga o caso, ainda aguarda o resultado do laudo sobre a causa da morte, mas a principal suspeita é de que Henrique pode ter sido intoxicado pelo produto, que é um ácido usado sobre a pele para retirar manchas e rugas devolvendo a elasticidade.

Em uma declaração à imprensa, após ser interrogada na delegacia, Natalia havia dito que a morte de Henrique “acabou com a minha vida”. A reportagem tenta contato com a defesa da dona da clínica para comentar o assunto.

Marcelo contou ainda que Henrique teve uma reação súbita após se queixar das dores que estava sentindo. “Ele apertou meu braço, arregalou os olhos e… sufocado, disso ele já foi… e dali não tinha mais nada”.

Uma das suspeitas investigadas pela polícia é a de que Henrique possa ter tido algum tipo de reação alérgica ao tratamento e morrido por “choque anafilático” pelo uso de alguma substância química, entre elas o fenol. Peritos disseram que uma das hipóteses é a de que o paciente teria inalado o produto, se asfixiado e sofrido uma parada cardíaca. Segundo eles, Henrique teve queimaduras faciais.

“Nossa convicção é de que ele foi asfixiado de forma tóxica pelo uso do fenol. Esse produto, ao ser aplicado, percorreu toda a via respiratória do Henrique. Além do cheiro, foi provavelmente pelo fato de que ela aplicou antes: riscou toda a face dele e passou esse produto”, explicou o advogado Adrian Piranga. “Tivemos essa informação através de uma fonte do IML [Instituto Médico Legal]. Porém, nós precisamos aguardar o laudo.”

Natalia realizou o tratamento com o fenol, que é um composto orgânico ácido, no rosto de Henrique. A substância química provoca uma reação inflamatória na pele. A inflamação causa descamação da superfície do tecido. O objetivo é reduzir manchas, rugas e cicatrizes, devolvendo a elasticidade da face.

Mas não foi isso o que ocorreu. Por esse motivo, a advogada Elaine afirmou que o escritório de advocacia que representa a mãe de Henrique irá entrar na Justiça com uma ação contra Natalia cobrando dela o pagamento de indenização por dano moral.

“A mãe do Henrique é uma pessoa extremamente simples que dependia dele financeiramente e a Natalia, ao fazer esse procedimento, assumiu o risco do resultado. E ela tem uma responsabilidade civil em cima disso”, disse a advogada.

Natalia Becker é o nome fantasia de Natalia Fabiana de Freitas Antonio. Ela tem 29 anos e não é médica. Também não é especialista em dermatologia. A polícia também investiga se ela chegou a usar algum registro profissional falso ou de outra pessoa para se passar por médica em algum momento.

Natalia diz ainda possuir três clínicas com o nome Studio Natalia Becker: em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Goiânia. Tem mais de 230 mil seguidores no Instagram.

Fonte: G1

Compartilhe
Facebook
WhatsApp
X
Email

destaques da edição impressa

colunistas

Cláudio Pissolito

Don`t copy text!

Entrar

Cadastrar

Redefinir senha

Digite o seu nome de usuário ou endereço de e-mail, você receberá um link para criar uma nova senha por e-mail.