De Deus sempre esperamos o impossível. Contrassenso da fé, já que no vocabulário do Criador o impossível inexiste. Da mesma forma, agem absurdamente os que negam a existência divina. Não acreditam em Deus, conquanto Deus acredite neles! Falta-lhes maturidade, a serena filosofia da vida dos que ainda fazem da fé um valor humano.
Assim, do alto de meus já seniores anos de existência, vejo tais contrapontos como corriqueiros e naturais. No entanto, mais pra lá do que pra cá, a hoje reformulada terceira idade nos surpreende. Muitos revivem etapas da própria vida como se nunca as houvessem vivido. Outros se entregam à volúpia de novas experiências, como a recuperar tempos perdidos. Alguns ainda se lembram de Deus. Outrora era a maioria.
O conselho dos anciãos da modernidade se ocupa agora do impossível: reencontrar a fonte da eterna juventude. Palavra de ordem em suas pautas: não entregar os pontos! Como se o trem da eternidade apitasse numa esquina da avenida. Acreditam ou não?
Acreditar é a questão. Da minha parte, acredito nessa mística humana que renova forças, refaz energias e possibilita novos sonhos a todos, independentemente da idade. Mesmo assim, crendo ou não, um dia chegará o momento de confrontar a Verdade, cara a cara, frente a frente.
Deus existe. Ora, se Deus existe, por que sua “imagem e semelhança” prefere caminhos tortuosos, acumula mais defeitos que qualidades, mais ódio do que amor, mais guerra do que paz? Por que tanta desigualdade entre iguais? Tanto descrédito entre crentes? Tanta fé entre ateus?
“Meu Deus, livrai-me das mãos dos iníquos, das garras do inimigo e do opressor” (Sl 70). Essa deveria ser a oração da terceira idade. Um grito, quase lamento dos que confrontam a realidade avassaladora das incoerências humanas. Um brado de sabedoria, a própria voz. “Sejam confundidos e pereçam os que atentam contra minha vida, sejam cobertos de vergonha e confusão os que procuram minha desgraça (13), diz o salmista, para quem o sentido da vida já perfaz os limites da glória celeste. Vida plena ultrapassa a existência física.
“Vós me tendes instruído, ó Deus, desde minha juventude, e até hoje publico as vossas maravilhas” (17). A fé amadurecida e autêntica não se adquire na velhice. Vem do berço. Felizes os que a consolidam na tenra idade. “Na velhice a até os cabelos brancos, ó Deus, não me abandoneis, a fim de que eu anuncie à geração presente a força do vosso braço” (18). Quem se negará a ouvir a voz da experiência?
No entanto, o que vemos nos causa espanto. Esse arrefecer da fé, entre muitos dos nossos modernos avós, é preocupante. Constrangedor para a Igreja, porém sinal dos tempos para os cronistas do mundo globalizado. Sem valores de fé, a brutalidade nas relações é evidente. O homem se desumaniza. A exemplo de Tomé, estamos pagando pra ver. A fé do cético (sim, porque todos acreditam de alguma forma) só se manifesta vendo. A fé genuína enxerga com o coração acima da lógica. Entre uma e outra se situa a maturidade, o testemunho daqueles que já vivem uma existência de fé e devoção. De nossos pais e avós herdamos nossa fé. Agora nos resta bradar aos céus: “Aumentai minha grandeza e de novo consolai-me” (27). Que a fidelidade e o exemplo de nossos ancestrais nos reanimem, tornem possível o impossível e impossível o possível. Pois, queiramos ou não, Deus ainda acredita em nós.