Mulheres que denunciaram abusos sexuais sofridos durante consultas realizadas pelo ginecologista José Hilson de Paiva, 70 anos, prefeito afastado de Uruburetama (CE), dizem que foram ameaçadas por aliados políticos do médico. Segundo as vítimas, vereadores passaram a ameaçar a integridade física das ex-pacientes do prefeito desde que as revelações dos abusos vieram à tona.
O G1 teve acesso a 63 vídeos registrados pelo próprio médico durante as consultas. Para a Associação Médica Brasileira, as imagens mostram “claramente” um caso de estupro de pacientes. Hilton de Paiva afirma que as denúncias são uma jogada da oposição que quer “derrubá-lo”.
Após as denúncias, os vereadores de Uruburetama votaram pelo afastamento de 90 dias do médico e prefeito do município. Além disso, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) afirmou que expulsou o médico da sigla. Nesta terça-feira (16), Artur Wagner Vasconcelos Nery, vice-prefeito de Uruburetama, assumiu a prefeitura e disse que se “arrepende” da aliança com o antigo gestor.
As vítimas do médico ginecologista afirmam que alguns vereadores que apoiavam o então prefeitura realizaram ameaças para que as acusações fossem retiradas. “Fui ameaçada por alguns vereadores que estão do lado dele, porque estão dizendo que tudo que aconteceu é mentira, mas não é”, revela a mulher, que pediu para não ser identificada.
Assim como outras pacientes e vítimas, ela procurou ajuda médica após sangramentos no canal vaginal, mas acabou sendo surpreendida com a conduta de Hilson Paiva. “Ele pegou nos meus seios, nas minhas partes e mandou eu abrir bastante as pernas”, relata.
TRANSTORNOS
Não bastassem as intimidações feitas pelos integrantes da Câmara Municipal de Uruburetama, a vítima amarga o sofrimento de ver a sua imagem ser motivo de chacota nas ruas e até dentro de unidades de saúde da cidade.
“Muita gente fica ‘mangando’ (zombando), apontando, é muita perseguição. Se venho para uma consulta, tem horas que ninguém me atende”, lamenta, desejando que haja um desfecho deste capítulo “porque tenho filhos e esposo”, finaliza.
Outra vítima, que também terá a identidade preservada, diz que passou a ver movimentações suspeitas na rua onde mora, em Uruburetama, após as denúncias. O irmão dela relatou que havia um veículo de aliados do prefeito parado na esquina, o que causou estranhamento em sua família, uma vez que o fato não é comum no entorno da casa.
O caso aconteceu na última quinta-feira (11/07), mesmo dia em que o G1 esteve na cidade para apurar os indícios de abuso do prefeito José Hilson de Paiva. “O carro passou 15 minutos parado com pessoas dentro. Ninguém saiu e depois, o veículo partiu”, diz. Para ela, os supostos parceiros do chefe do executivo municipal estariam “vigiando” os seus passos.
INVESTIGAÇÕES
No dia seguinte ao escândalo provocado por novas denúncias de crimes sexuais atribuídas ao prefeito, a Polícia Civil do Ceará (PCCE) iniciou investigações para apurar os fatos. O gestor é suspeito de abusos sexuais desde a década de 1980, embora nunca tenha sido punido pela prática. Em 1994, duas donas de casa o acusaram de assédio sexual.
A titular da Delegacia Municipal de Uruburetama, Rogéria de Sousa, confirmou que instaurou, na segunda-feira (15/07), um Inquérito Policial mediante portaria para analisar o material que estava em posse do Ministério Público do Ceará (MPCE), que contém 63 vídeos com cenas de supostos crimes sexuais praticados.
“Tanto o inquérito aqui em Uruburetama como em Cruz já foram instaurados. Nós vamos analisar as filmagens por completo, não só o que foi divulgado na mídia, e vamos ouvir mais vítimas. Vamos ouvir aquelas que já se disponibilizaram a falar e poderemos encontrar mais outras vítimas”, afirma.
Rogéria de Sousa irá se reunir com o promotor de Justiça do Município para traçar as estratégias de investigação acerca das novas denúncias. O MPCE já abriu investigação em Fortaleza sobre o caso. Duas vítimas se apresentaram à Delegacia de Cruz para prestar depoimento, mas nenhuma foi à Unidade de Uruburetama durante a segunda-feira.
Outra mulher, vítima do médico, recorre à fé para tentar superar o que ela denomina de “coisa lamentável”.
“Eu estou fugindo de tudo isso, porque eu passo muito mal. Passo o dia todo deitada, a cabeça dando voltas, sem equilíbrio emocional para nada. Agora mesmo, eu estava falando com Deus, pedindo forças, porque o que eu mais quero é esquecer dessa coisa lamentável que acabou com a minha cabeça”, lamenta.
Fonte: G1