Cláudio Pissolito
O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, que pertence a uma dinastia política do Amazonas, Estado que abriga mais da metade da floresta equatorial brasileira, resolveu inovar nos métodos de combate ao Novo Coronavírus.
Em vez de seguir as recomendações da OMS – Organização Mundial de Saúde, que nada sabe sobre o vírus, ou de replicar os exemplos positivos da Coreia do Sul e do Japão, que acertaram muito mais pela disciplina e bons hábitos do seus povos do que pelas medidas adotadas pelos seus dirigentes, Arthur Neto preferiu pedir ajuda à adolescente Greta Thunberg.
Greta é aquela menina ambientalista precoce, pequenina, carrancuda, cabuladora de aulas e que aleatoriamente foi eleita pela imprensa mundial como salvadora do Planeta, mas que muito injustamente foi velozmente esquecida.
A cidade dirigida pelo Arthur Netinho e transformada numa espécie de província florestal hereditária ao abrigar o clã Virgílio, que se orgulha do nome e do sobrenome, foi eleita capital nacional da incompetência, da insalubridade, do superfaturamento e do caos sanitário, pois o sistema de saúde entrou em colapso devido ao número de doentes incompatível com a capacidade de atendimento e do número de mortos muito acima das possibilidades do serviço funerário municipal.
Mas Netinho não se intimida com rótulos, críticas ou as injustiças que fazem com sua administração ou com sua família, pois além de filho de Arthur Virgílio Filho, que começou a carreira como deputado ainda nos anos de 1940, ele é pai de Arthur Virgílio Bisneto, que cumpre mandato como deputado federal. Mas também é diplomata de formação, foi orador de sua turma de formandos e depois Senador e, portanto, sabe muito bem se safar de seus maldosos algozes e se eximir de suas responsabilidades.
Apelar para Greta é uma desculpa estranha, difícil de entender, mas não se deve duvidar das estratégias de Arthur Netinho, filho de Arthur Filhinho e pai de Arthur Bisnetinho. Assim como os cargos parecem hereditários, a astúcia política também pode ser transmitida pelo sobrenome.
Netinho quer que a menina use sua influência internacional para angariar recursos para salvar a população da cidade que abriga povos ribeirinhos, que ele diz ser formada de protetores da floresta, tentando induzir a inocente menina a imaginar que os Manauaras vivem com baldes nas mãos apagando incêndios florestais.
Certamente, Arthur Neto não disse a Greta que a bela Manaus, capital que enriqueceu muito no início do século passado graças à destruição de grandes áreas florestais para exploração do látex transformado em borracha, é anfitriã de uma Zona Franca, imune de impostos, que mantém às margens dos seus enormes rios um polo industrial e tecnológico para fabricação de computadores, equipamentos industriais e motocicletas, tudo aquilo que os ambientalistas usam, mas abominam.
Também não quer que se discuta as questões sanitárias da cidade nascida e crescida na confluência dos rios Negro e Amazonas, onde as águas não se misturam, mas recebem dejetos industriais e praticamente todo o esgoto dos quase dois milhões de mortais que, infectados ou não, defecam todos os dias.
Para Arthur Neto, o vírus não se combate com hospitais, UTIs, medidas de proteção, com recolhimento, cuidados ou isolamento social, mas sim com Dólares e Euros que só Greta, com sua influência já bastante relegada, poderia canalizar para os cofres públicos da cidade floresta.
Entretanto, a possibilidade de colaboração de Greta é duvidosa caso ela saiba que é justamente pelo Rio Amazonas, que garante a condição de Manaus como capital das águas, é que navegam milhares de barcas e também muitos navios cargueiros, grande parte deles estrangeiros, que transportam a madeira nobre que abastece as indústrias moveleiras de países europeus, principalmente da Inglaterra.
Greta também não deve saber que sob o solo da floresta que circunda Manaus e outras grandes cidades amazônicas, paraenses, amapaenses e maranhenses existem gigantescas reservas dos mais variados minérios, incluindo os mais valorizados no mercado internacional, que são extraídos pelas multinacionais, algumas delas de seu exemplar país de origem.
E muito menos que essas riquezas são contrabandeadas para abastecer as indústrias tecnológicas não poluentes, para fabricação ecologicamente correta de baterias de automóveis elétricos, por exemplo, naquelas nações que mais respeitam o meio ambiente e que financiam a proteção da floresta ameaçada por aqueles madeireiros pobres que desejam criar gado nas clareiras das árvores.
Caso o pedido emocionado de Arthur Neto chegue aos ouvidos de Greta e alguém ouse cochichar a ela esses absurdos que a menina sequer sonha e que os ambientalistas nunca questionam além dos incêndios, Greta deixará o posto de coqueluche do ambientalismo.
Com essas dúvidas na mente, a menina será a Sofia ambiental, aquela que terá de fazer escolhas mergulhada em dilemas existenciais, preservacionistas e ecológicos nunca antes experimentados por um ser humano ainda tenro e puro de alma, independente do mau humor e da carranca ameaçadora que exibe para alegria de fotógrafos e cinegrafistas do mundo globalizado.
O autor é jornalista e mantém o Blog do Cláudio Pissolito no portal jornaldacomarca.com.br