Conhecido no meio como Bertola, Benedito Hélio Orlândi é o vice-presidente da Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto – FEBRAPDP para o Estado de São Paulo. O palmitalense é também presidente da Associação de Plantio Direto do Vale Paranapanema – APDVP, além de ser engenheiro agrônomo e produtor rural na cidade de Palmital, SP. Entusiasta do Sistema Plantio Direto (SPD), Bertola tem uma visão bem ampla e realista dos desafios, mas é otimista com relação ao avanço das bases da agricultura sustentável contempladas pelo SPD. Neste sentido, reforça a ideia da união de vários agentes do setor em torno da causa. Na entrevista que nos concedeu, ele enumera iniciativas que caminham nesta direção, bem como apresenta dados que fornecem uma visão bem detalhada do SPD em terras paulistas.
P: Quais as estimativas de áreas sob PD de forma parcial e de áreas sob o SPD de forma integral?
R: A área total do Estado de São Paulo é de 24,82 milhões de hectares, dos quais possui uma área cultivada de 9,25 milhões de hectares.
Sabemos que a agricultura paulista é bastante diversificada, pois além das culturas anuais (soja, milho, milho 2ª safra), também possui uma área extensa com culturas perenes, entre as quais destacamos a cana-de-açúcar, a citricultura, a cafeicultura, as pastagens e também a silvicultura.
Em relação à área de culturas anuais, que é o que nos interessa em relação ao Plantio Direto, podemos destacar a soja com 1,28 milhão de hectares, o milho 1ª safra com 360 mil hectares e o milho de 2ª safra com 485,8 mil hectares.
Acredito que se pratica o Plantio Direto em torno de 80% da área cultivada, sem utilizar o tripé de sustentabilidade do Sistema Plantio Direto; ou seja, apenas com o binômio soja verão e milho 2ª safra e os 20% restante que saem fora da janela ideal para se plantar o milho de 2ª safra são plantados com aveia, sorgo, milheto, trigo etc.
Em parte da região sudoeste do Estado, se planta trigo no lugar do milho de 2ª safra, face a limitações climáticas, porém, continua sendo um binômio.
A cultura da soja tem avançada em áreas de pastagens degradas, e como o Estado possui uma área expressiva com a cultura de cana-de-açúcar, na sua reforma se utiliza o plantio de soja e do amendoim, em forma de parceria e através do sistema convencional. Já existem algumas áreas onde se realiza o Plantio Direto da soja logo após a colheita mecanizada da cana-de-açúcar na biomassa deixada pela colheita da mesma e os resultados são excelentes.
Em relação ao Sistema Plantio Direto integral pelos agricultores paulistas, baseado no tripé de sustentabilidade é muito difícil mensurá-lo, e acredito que para ser bem otimista, podemos considerar uma estimativa em torno de 6 a 8%.
P: Qual a justificativa para a adoção apenas parcial? Há explicações econômicas, agronômicas/técnicas, culturais ou outras ou todas juntas?
R: A principal justificativa para a adoção parcial em relação ao SPD apenas parcial, tem como fundamento principal o lado econômico, decorrente da estrutura fundiária das propriedades rurais, onde predomina as pequenas e médias propriedades, em cujo sistema de exploração predomina os arrendamentos e os produtores rurais necessitam de plantar duas culturas para tentar buscar o equilíbrio financeiro na sua atividade, principalmente em relação aos custos de produção e dos arrendamentos que estão cada vez mais caros.
Também a visão imediatista dos produtores rurais de que os resultados de um SPD bem feito normalmente ocorre a médio e a longo prazo, os impede de trabalhar com rotação de culturas e plantas de coberturas em seus sistemas de produção e dessa maneira o seu modelo de exploração fica comprometido pela falta desses componentes de sustentabilidade.
P: Na sua opinião, qual o principal desafio a ser vencido para reversão deste quadro?
R: Na minha visão, a reversão desse quadro acontecerá, a partir do momento em que o produtor rural, perceber que apenas em se trabalhando com o Plantio Direto como binômio, ocorrerá vários problemas de ordem edáficas como: compactação do solo, declínio teor da matéria orgânica no solo (MOS), menor armazenamento de água muitas vezes com escorrimento superficial, e de ordem fitossanitário, como o surgimento de novas pragas e plantas daninhas com resistência, e consequentemente a perda de capacidade produtiva do seu solo, o que no futuro poderá inviabilizar a sua atividade.
Para que isso não aconteça se faz necessário fazer uso da experimentação com resultados validados, bem como a união de esforços através das universidades, órgãos de pesquisas, cooperativas, revendas de insumos, bem como a assistência técnica e que esses resultados cheguem até os produtores rurais de uma maneira efetiva e em conformidade com a sua realidade.
P: A partir da missão da Federação de tornar o SPD ainda mais adotado, valendo-se, inclusive, da capilaridade dos estados, como especificamente no seu estado esse esforço será feito? Já existem ideias, projetos, estratégias para essa tarefa?
R: Sim, continuaremos fomentando a necessidade de se fazer um SPD com qualidade no nosso Estado, e a parceria é uma estratégia interessante com a participação da APDVP, FEBRAPDP, Cooperativas, Sindicatos, CATI, IAC etc. na busca de se atingir um número significativo de produtores rurais e essa ação multiplicadora através de relatos dos próprios produtores, aos produtores ainda céticos das vantagens do SPD integral, em relação ao PD nos levará com certeza a ganhos de novos adeptos do SPD baseado no tripé de sustentabilidade. Já estamos programando um evento para setembro desse ano com o apoio da FEBRAPDP e empresas parceiras, com palestras e dia de campo com o objetivo de mostrar os benefícios do Sistema Plantio Direto com qualidade na Fazenda Santo Antônio, no município de Florínea, SP.
Tenho participado de vários eventos relacionados ao Plantio Direto no nosso Estado e sempre que possível, procuro mostrar a triste realidade em que ainda nos encontramos em relação à área do SPD e normalmente aproveito para fazer um “merchan” e convido os produtores rurais, profissionais da área agronômica e estudantes de graduação a se associarem à FEBRAPDP para conhecê-la melhor.
P: Como o senhor vê e sente o engajamento/interesse dos produtores estaduais em se envolverem ou, tão somente, ouvirem orientações técnicas que proponham essa mudança para a adoção mais integral do SPD?
R: Vejo com bastante otimismo algumas situações que têm levado alguns produtores rurais que já estão trabalhando com o consórcio de milho 2ª Safra com braquiária e alguns um pouco além já trabalhando com Integração Lavoura e Pecuária (ILP), buscando validar os resultados dessas experimentações.
Também no Oeste Paulista, existem trabalhos em parceria da Unoeste com a Cocamar e a Embrapa Cerrados de ILP e ILPF em solos de textura arenosa e com baixos teores de argila e cujos resultados são surpreendentes, inclusive com Curso de Pós-Graduação nessa área, o que poderá alavancar essa tecnologia para outras regiões com características semelhantes.
No restante do Estado onde predomina outras culturas, os produtores rurais têm trabalhado com o objetivo de manter a palhada oriunda da colheita mecanizada nas entre linhas como é o caso específico da cana-de-açúcar, e também no caso da citricultura, cafeicultura o plantio de braquiária nas entre linhas é uma prática cada vez mais usada.
Face a esses relatos é extremamente importante os produtores rurais se preocuparem com a sustentabilidade da sua atividade agrícola, pois cada vez mais os países importadores e os próprios consumidores mais exigentes, estarão preocupados com a rastreabilidade da produção agrícola.
Como técnico observo que os produtores rurais paulistas ainda sentem dificuldades da adoção do SPD, no entanto, se o mesmo for desenvolvido corretamente com boas palhadas, rotação de culturas e manejo adequado da fertilidade do solo, pragas e doenças, os resultados são fantásticos em qualquer situação.
Fonte: Redação FEBRAPDP