Prefeita de Votorantim denuncia presidente da Câmara por estupro: ‘Tentou me beijar’

A prefeita de Votorantim (SP), Fabíola Alves (PSDB), denunciou o presidente da Câmara dos Vereadores, Thiago Schiming (PSDB), por estupro. O caso teria acontecido em junho deste ano, e o boletim de ocorrência foi registrado na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) da cidade na manhã de quinta-feira (07/12).

O vereador negou a situação, incluindo a suposta alegação de que teria investido contra a prefeita por mensagens.

Em entrevista exclusiva ao g1 e à TV TEM, Fabíola conta que, no dia 12 de junho, quando, coincidentemente, ela e o presidente da Câmara fazem aniversário, Thiago esteve no gabinete dela, por volta do horário do almoço, acompanhado de outros dois vereadores, Cirineu Barbosa (PMN) e Cesar Silva (Cidadania), para parabenizá-la. O trio presenteou a prefeita com chocolates e um cartão.

Prefeita de Votorantim (SP) denuncia presidente da Câmara por estupro — Foto: Ana Paula Yabiku/g1

Prefeita de Votorantim (SP) denuncia presidente da Câmara por estupro — Foto: Ana Paula Yabiku/g1

Em seguida, conforme o relato de Fabíola, os três saíram da sala, mas Thiago retornou sozinho e encostou a porta do gabinete. Neste momento, ainda segundo a prefeita, o presidente do Legislativo tentou beijá-la três vezes à força, segurando seu queixo e empurrando o corpo contra o dela.

“Eu já fiquei próximo da porta, não quis sentar e ficar à vontade com ele. Eu estava já nervosa. Ele começou a pegar na minha mão, falar que eu era muito importante para ele e a chegar perto. Eu falei que, para mim, ele era um amigo muito especial”, diz.

“Daí fui me despedir, ele tentou me beijar e eu virei o rosto. Depois da terceira tentativa, ele começou a pegar no meu queixo, encostar o corpo e forçar para me beijar realmente. Eu consegui soltar e apertar um botão da minha porta. Ele soltou, falou ‘calma’ e saiu bem nervoso”, completa.

Caso teria acontecido no gabinete da prefeita de Votorantim (SP) — Foto: Prefeitura de Votorantim/Divulgação

Caso teria acontecido no gabinete da prefeita de Votorantim (SP) — Foto: Prefeitura de Votorantim/Divulgação

De acordo com Fabíola, logo após o ocorrido, Thiago deixou o gabinete visivelmente nervoso. Poucos minutos depois, o presidente da Câmara voltou a entrar em contato com Fabíola pelo WhatsApp, enviando uma foto que havia tirado com ela e os outros dois vereadores no local, seguida da mensagem “me perdoa” (veja abaixo).

No mesmo dia, Fabíola relatou o que havia acontecido à secretária, ao assessor de governo e a um primo. Além disso, bloqueou Thiago no celular e nas redes sociais para impedir que ele voltasse a procurá-la. Desde então, os dois não tiveram mais contato pessoalmente, o que tem prejudicado o andamento de alguns projetos municipais.

Thiago mandou mensagem a Fabíola pedindo perdão — Foto: Reprodução/WhatsApp

Thiago mandou mensagem a Fabíola pedindo perdão — Foto: Reprodução/WhatsApp

“É muito difícil trabalhar assim. Eu estou com um monte de projeto parado na Câmara e eu não consigo ter diálogo. Tem evento que eu não posso participar porque… Como que eu vou ficar do lado de uma pessoa que aconteceu uma coisa dessa? Fica difícil o trabalho nesse sentido. Não é fácil externar isso”, continua.

Seis meses depois

Fabíola decidiu denunciar o caso, registrado como estupro na delegacia, seis meses depois do ocorrido por conta de um processo de cassação que estava enfrentando na Câmara.

Fabíola Alves (prefeita de Votorantim) e Thiago Schiming (presidente da Câmara dos Vereadores) — Foto: Divulgação - Reprodução/Instagram

Fabíola Alves (prefeita de Votorantim) e Thiago Schiming (presidente da Câmara dos Vereadores) — Foto: Divulgação – Reprodução/Instagram

“Primeiro que não é fácil essa exposição. Eu faço isso também em nome das mulheres. Segundo que eu estava no meio de um processo de cassação e, se eu externasse algo nesse sentido, ia parecer que eu estava fazendo para desviar alguma atenção de alguma coisa. Eu queria que esse processo fosse arquivado. Eu queria provar que eu era inocente naquele processo para eu poder, então, ficar livre para realmente denunciar tudo o que eu senti naquele momento”, explica.

A prefeita foi investigada por uma Comissão Especial de Inquérito (CEI), aberta no dia 27 de junho, por supostas irregularidades no aumento do próprio salário e no salário dos secretários municipais. No dia 10 de outubro, no entanto, Fabíola conseguiu uma liminar na Justiça que suspendeu a sessão que poderia cassar o mandato dela.

Na decisão, o juiz entendeu que o processo administrativo já tinha ultrapassado o prazo de 90 dias e um julgamento fora do prazo seria nulo. O caso foi arquivado automaticamente.

Vereadores abriram Comissão Especial de Inquérito para investigar a prefeita de Votorantim (SP) — Foto: Câmara de Votorantim/Divulgação

Vereadores abriram Comissão Especial de Inquérito para investigar a prefeita de Votorantim (SP) — Foto: Câmara de Votorantim/Divulgação

Para Fabíola, a suposta rejeição pode ter incentivado Thiago a articular com os vereadores da oposição para que a CEI contra ela fosse instaurada.

“É muita coincidência ter acontecido o que aconteceu. Até então, ele me elogiava na parte administrativa nas redes sociais, estava sempre externando apoio. E, dias depois do ocorrido, a conduta começa a ser completamente outra. Através de outros secretários, ele andou insinuando coisas para tentar me calar, querer me desqualificar como mulher”, alega.

Amizade antiga

Ao g1 e à TV TEM, Fabíola conta que desenvolveu uma amizade com Thiago ainda na adolescência por conta do viés político comum entre os dois. Ela, inclusive, é madrinha de casamento do vereador, que tem uma filha.

No entanto, a prefeita, que também já foi casada e se separou há cerca de dois anos e meio, diz que notou que Thiago costumava confundir os sentimentos por ela, chegando a se declarar romanticamente para ela em algumas ocasiões. Mesmo assim, o relacionamento entre eles sempre foi apenas de amizade.

“Com um pouco de frequência, ele externava ter um sentimento por mim que era um pouco mais do que amizade. Ele falava que eu era muito importante, que eu era uma mulher muito especial para ele… No WhatsApp ele chegou a escrever que estava comigo para a vida toda e chegou a falar mesmo ‘eu te amo de um jeito que você jamais vai entender, embora você me esnobe. Mas, da minha parte, sempre 100% foi estritamente amizade mesmo”, relata.

De acordo com Fabíola, as tentativas de ter algo a mais com ela se tornaram mais insistentes depois que Thiago se tornou vereador e, posteriormente, presidente da Câmara, no início deste ano. A prefeita diz ter ouvido algumas indiretas e comentários indelicados e desrespeitosos feitos por Thiago durante reuniões com outros vereadores.

“Ele fazia algumas insinuações machistas, que me incomodavam bastante. Começava a mandar algumas mensagens. Às vezes até algumas abordagens pessoalmente. Um dia em que eu fiquei muito incomodada foi quando teve um show na festa junina e uma pessoa deu uma camiseta para que eu tirasse uma foto de um projeto. A família dele estava presente neste ambiente, e ele ficava perguntando quando podia colocar a camiseta em mim, e algumas insinuações que me deixavam bastante constrangida”, continua.

‘Agora tenho convicção de que fui vítima’

Além do processo de cassação, Fabíola explica que foi necessário entender que ela havia sido vítima de assédio para, só então, poder denunciar: “o trabalho psicológico da vítima é muito complicado, porque a gente demora a assimilar o que aconteceu. Então, agora eu tenho convicção de que eu fui uma vítima”, conta.

No caso da prefeita, a ficha só caiu durante uma conversa com uma amiga próxima que também ocupou um cargo de destaque e passou pela mesma situação de assédio.

“Eu fiquei bastante envergonhada e constrangida. Quando a gente conversa com mulheres que já passaram por isso, a primeira coisa que a gente pensa é: ‘o que eu fiz de errado?’. E a gente não fez nada de errado, mas a gente se culpa em um primeiro momento. A gente precisa começar a encarar esse problema como ele é na realidade: a gente foi vítima. Não tem que ter medo de falar sobre isso e nem vergonha, porque quem fez algo de errado não fomos nós.”

DDM de Votorantim (SP) vai investigar o caso — Foto: Reprodução/Google Street View

DDM de Votorantim (SP) vai investigar o caso — Foto: Reprodução/Google Street View

O caso será investigado pela DDM de Votorantim, e Fabíola espera que seja tomada alguma atitude.

“A gente está em um espaço que é tão difícil, é a primeira vez que uma mulher chega na Prefeitura de Votorantim. A cidade nunca tinha tido prefeita, nem vereadora. Então, a gente ocupar esses espaços já não é fácil. E aí, você ocupa um espaço, de repente tentam te tirar por conta de um capricho masculino. É muito triste isso”, comenta.

Foi inspirada pelos familiares, colegas de trabalho e por outras mulheres famosas que também denunciaram casos de violência contra a mulher que Fabíola decidiu ir à delegacia.

“É difícil porque a gente ocupa um cargo, mas, acima de tudo, a gente é uma mulher. Então, a gente é um ser humano, tem família, a gente tem os nossos sonhos, as nossas expectativas de vida. Da mesma forma que é difícil para todas as mulheres, não é porque eu sou prefeita que também não é difícil para mim. Eu não quero que outras mulheres que venham a ocupar espaços passem pelo que eu passei”, finaliza.

‘Perseguição política’

Thiago Schiming, presidente da Câmara de Votorantim (SP), durante entrevista à TV TEM e ao g1 — Foto: Marcel Scinocca/g1

Thiago Schiming, presidente da Câmara de Votorantim (SP), durante entrevista à TV TEM e ao g1 — Foto: Marcel Scinocca/g1

Em entrevista à TV TEM e ao g1, Thiago negou as acusações. O parlamentar, inclusive, disse que não fez qualquer investida contra a prefeita, mesmo por mensagem.

“Vejo isso como um grande absurdo, essa denúncia. Sem cabimento nenhum. Eu e a prefeita sempre tivemos amizade. A prefeita é uma amiga de infância, é madrinha de casamento meu. A gente teve sempre uma amizade muito próxima”, diz.

Ele contou que realmente esteve no gabinete da prefeita, acompanhado de outros dois parlamentares. Schiming disse, ainda, que permaneceu no local após a saída dos colegas. Segundo ele, o assunto foi em torno da escolha do candidato a vice-prefeito da cidade em 2024. Segundo ele, os dois discordaram de quem seria.

Ele lembra que, instantes depois, Fabíola teria postado uma foto, agradecendo a visita. Ainda conforme Schiming, a prefeita, na mesma data, mandou uma mensagem carinhosa direcionada a ele.

“Eu vejo como uma surpresa. Como que uma pessoa pode postar uma foto de agradecimento de aniversário, mandar no meu WhatsApp pessoal, como sempre mandou com muito carinho, muita amizade, felicitações pelo aniversário, de repente, vem com uma mensagem absurda e irreal dessa, visando somente política. Tudo isso para ser uma questão… Politicagem mesmo, suja e baixa.”

O parlamentar também negou que tenha tocado no rosto e no pescoço dela. “Essa história de que eu cheguei e toquei, por exemplo, no rosto, no pescoço dela… Se eu tivesse feito isso, qualquer mulher do mundo teria gritado, pedido socorro, ligado à polícia, ameaçado. Não, o que ela fez? Mandou mensagens no fim dia desejando felicitações, ‘que a espiritualidade te proteja, que você é muito querido’. Então, não tem cabimento nenhum, é infundada essa denúncia”, diz.

“Eu segui o que tinha que fazer. Levei o processo ao plenário. A partir dali, começou uma campanha contra mim. Não contra mim, mas contra o vereador Cirineu (Cirineu Barbosa – PMN). Nós fomos vítimas de pressão, de ameaças. Eu tenho aqui, e agora vou buscar os meus direitos, inúmeras ameaças da prefeita e do grupo da prefeita a mim. Ameaças, inclusive, sérias de ‘vou acabar com a sua vida’, ‘se você botar para votar a consciência é sua, mas vai ter consequências’. Uma perseguição que não parou. Se encerrou o processo e continua essa perseguição a mim, politicamente e pessoalmente, chegando a ter mensagens da prefeita, onde ela diz que existe um grupo dentro da prefeitura que estaria perseguindo eu, para cuidar da minha vida pessoal”, afirma.

Ele também negou qualquer tipo de ato íntimo entre os dois. Thiago disse, ainda, que, após receber a denúncia contra Fabíola na Câmara de Votorantim, ele passou a ser perseguido pela prefeita.

O vereador ainda considerou “sem sentido” a alegação de que o processo da Comissão Processante da Câmara tenha começado como retaliação depois de uma negativa diante das supostas investidas dele.

Conforme Schiming, a mensagem “me perdoa”, enviada por ele logo após a visita ao gabinete, teria sido em função das discussões pelo candidato ao cargo de vice-prefeito. Ele disse também que a discussão teria ocorrido de forma ríspida.

Por fim, Thiago comentou sobre a mensagem na qual diz que ama Fabíola. “Não me recordo disso, sinceramente. Quando falo que ‘nunca vou largar você’, estou falando da questão política. Isso aí é uma questão de amizade. Não me lembro, tem que pegar todo o contexto da conversa”, finaliza.

Fonte: g1

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Cláudio Pissolito

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