SIMPLESMENTE A FÉ

            A dualidade do ser humano, dividido que está entre corpo e alma, matéria e espirito, faz dele um animal acuado. Parece exagero, mas é exatamente assim que muitos transitam pela vida, divididos que estão nessa busca desenfreada da própria verdade. Crer ou não crer. Eis a questão.

            Essa era a questão central das pregações do grande místico Paulo de Tarso, o apóstolo dos gentios. Fez da doutrina da dúvida a teologia da verdade. Do crucificado o ressuscitado. Da fé ilícita a mais pura das certezas. Da lógica racional a racionalidade em pessoa, na pessoa dum mestre com o qual não conviveu, pessoalmente ao menos. Mas sempre falou do Mestre como alguém que lhe era íntimo, de quem recebia as revelações; desvendava-lhe os mistérios da fé com naturalidade sem igual. Procurava decifrar os mistérios com a simplicidade das palavras que lhe eram reveladas, com a sabedoria que inundava sua mente aberta aos mistérios da própria fé.

            Talvez seja esse o segredo que ainda não desvendamos dentro da realidade assaz materialista do mundo moderno. Procuramos muito, mas nada achamos de concreto quando a questão ultrapassa essa realidade tangível e limitada da matéria que somos. A doutrina budista, por exemplo, tenta justificar essa busca. Sidarta, um dos seus pregadores, assim pensava: “Procurar significa ter uma meta. Mas achar significa: estar livre, abrir-se a tudo, não ter meta alguma”. Então, quem encontra o caminho da verdade é alguém livre, até mesmo de um objetivo de vida? Pensar assim é perigoso. O próprio formulador dessa questão a rejeita: “Pode ser que tu, ó Venerável, sejas realmente um buscador, já que, no afã de te aproximares da tua meta, não enxerga certas coisas que se encontram bem perto dos teus olhos”.  Verdade nua e crua.

            O livre arbítrio justifica essa busca humana. A razão de sua fé é inerente aos sonhos de liberdade. Dizia Paulo: “Tudo é permitido, mas nem tudo é oportuno. Tudo é permitido, mas nem tudo edifica. Ninguém busque o seu interesse, mas o do próximo” (1Cor 10, 23-24). Eureka! O segredo está aqui, bem aos nossos olhos, realmente. Tudo nos é permitido, se considerarmos os direitos, as necessidades, os interesses, desejos e ideais do outro, daquele que caminha conosco, nossos próximos… Aquilo que fazemos em benefício dos semelhantes é que vai dignificar e justificar nossas ações de edificação e aprimoramento da fé que dizemos ter. Ter fé é construir a solidariedade, edificar a fraternidade entre nós. Para tanto, tudo nos é permitido.

            A ilicitude está no egoísmo de não dividir esse aprendizado de vida. Partilhar a fé é o primeiro ato de quem busca praticar o que de graça recebeu. “Eu recebi do Senhor o que vos transmiti”, justificava o apóstolo ao partilhar o pão eucarístico, o centro de sua fé voltada também aos irmãos mais fracos. Dizia a respeito: “Esta é a razão por que entre vós há muitos adoentados e fracos e muitos mortos” (1 Cor 11,30). Sem a partilha da fé, sem o pão da Vida presente e renovado nas nossas liturgias diárias, sem a divisão deste como centro da fé que nos une e nos nutre, nunca alcançaremos a plenitude de uma vida digna. Continuaremos mais matéria putrefata, perecível, passageira, do que espírito transcendente de luz e esperança.  A fé não se tem gratuitamente. Se busca, se aprimora. Não vem do berço, mas nele dá seus primeiros passos. Resta saber se a mão que embala esse berço também ensina a sair dele. A enfrentar a vida, o mundo, a sociedade como instrumentos de crescimento e solidariedades humanas, nunca ninho de intrigas e defesas pessoais. A fé, sem vistas às necessidades comunitárias, sem olhos para a integridade humana e fraternidade universal, não existe. Simplesmente assim. Não é fé.

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