A elite negra no Brasil

Não se tem devotado muita atenção à qualidade do negro que o Brasil teve o privilégio de receber, ainda que por uma instituição vergonhosa: a escravidão.

Júlio Medaglia já me alertara que as composições do Padre José Maurício, um sacerdote da raça negra, eram tão preciosas como as de seus contemporâneos europeus. E não era o único a produzir música no Brasil do século XVII.

Uma das explicações é a de que nações africanas em luta aprisionavam os inimigos e os vendiam. Dentre os vendidos, vinham nobres estirpes e detentores de uma cultura que sobreviveu na América, a despeito da crueldade, da chibata e da vida na senzala.

O talento negro logo se fez notar. O pernambucano Joaquim Saldanha Marinho era homem de cor. Ao lado de outro preto, Francisco Glicério, fundou o Clube Radical, ao lado de grandes personagens do Partido Liberal, como José Bonifácio, o Moço.

O mais ativo articulador do Clube Radical em São Paulo era Luis Gama, filho de escrava, ao contrário de Glicério, cuja mãe nascera livre. Luis Gama não chegou a se diplomar bacharel, mas se afirmara como advogado provisionado.

Luis Gama sonhava um Brasil sem rei nem escravos. O Clube Radical congregou os irmãos Américo e Bernardino de Campos, Campos Salles, Prudente de Morais, Martinho Prado Júnior, Luís Quirino dos Santos, Jaime Serva e Jorge de Miranda, irmão mais velho de Glicério.

Em 1870, o Clube Radical transformou-se no Clube Republicano. Mas a centelha inicial foi a de homens negros que se notabilizaram, transformaram o Brasil e ganharam o respeito de seus contemporâneos e de seus pósteros.

Glicério era um homem de profunda coragem. Apoiou Hermes da Fonseca, em detrimento da candidatura Rui Barbosa. Não teve pejo em pedir perdão, publicamente, ajoelhando-se no Senado, arrependido de ter contribuído para a eleição do marechal: “Todos os males, todas as fatalidades que pairam sobre a consciência nacional vêm do erro que cometemos, levantando a candidatura do marechal Hermes”. Houve um aparte. Mas ele continuou: “e de joelhos eu peço perdão à nação brasileira”.

Há exemplos de conduta análoga em nossos dias?

*José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente universitário, palestrante e autor de “Ética Geral e Profissional”, 13ª ed., RT-Thomson Reuters.

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