Simpósio internacional em Bauru (SP) discute desafios no tratamento da craniossinostose, que são malformações no crânio e face que podem ser associadas a síndromes. Problema pode afetar 1 a casa 2,5 mil nascimentos.
Pesquisadores se reúnem no interior de São Paulo pra discutir o diagnóstico e tratamento de pessoas com anomalias congênitas do crânio e da face
Durante o simpósio internacional sobre síndromes raras que podem causas anomalias craniofaciais, que reúne, em Bauru, especialistas do Brasil e do exterior, os profissionais destacaram a importância de se disseminar informações sobre o tema que auxiliem no diagnóstico e tratamento precoces.
O evento é realizado a partir desta quinta-feira (14) no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo (HRAC-USP) – o Centrinho – e discute os desafios no tratamento e busca dar visibilidade a essas síndromes.
A condição, chamada de craniossinostose, pode ocorrem em 1 a cada 2,5 mil nascimentos. São malformações congênitas que afetam o crânio e a face e podem ter causas isoladas ou serem associadas a síndromes raras.
As crianças que nascem com essa condição, que se caracteriza principalmente pelo fechamento precoce das suturas dos ossos do crânio ainda durante a gestação, podem desenvolver problemas na visão, audição e até na respiração e o diagnóstico precoce e acesso ao tratamento são essenciais para qualidade de vida. (entenda melhor abaixo).
O evento que discute as formas e o acesso ao tratamento dessas crianças é uma parceria do Centrinho com o Boston Children´s Hospital e promove um intercâmbio entre profissionais do Brasil, Estados Unidos e da França.
O cirurgião plástico e professor da faculdade de medicina de Harvard, John Meara é referência em cirurgias de síndromes raras e destaca a importância do tratamento logo no primeiro ano de vida.
“É importante que esses pacientes recebam o tratamento cedo, porque se não receberem o tratamento adequado no primeiro ano de vida, isso pode levar a consequências a longo prazo, cegueira, dificuldades intelectuais.”
Pela importância de facilitar esse acesso ao tratamento, um dos objetivos do simpósio é também abordar políticas públicas para os pacientes.
“Isso é muito importante, inclusive para que os pacientes que residem em outros estados da nação consigam ter acesso a esse tratamento que acontece em Bauru, por meio da regulação de vagas do Ministério da Saúde, da Secretaria da Saúde”
No Brasil, o tratamento disponível no sistema público de saúde oferece uma parte do tratamento aos pacientes.
“O Brasil tem centros de excelência no tratamento dessas deformidades e centros públicos e privados, mas o que acontece na prática é que alguns desses centros são localizados no sul do país e o acesso muitas vezes é bastante dificultado”, afirma o coordenador de Cirurgia Craniofacial do Centrinho.
“Temos grandes desafios no tratamento de craniossinostose sindrômica no Brasil, e uma delas é a integração de especialidades médicas. Obstetras e pediatras, por exemplo, precisam saber melhor sobre as síndromes para que o diagnóstico aconteça cada vez mais cedo”, completa.
Idealizadores do simpósio, o casal Natalia Jereissati e Igor Cunha, viveu na prática a dificuldade de um direcionamento para o tratamento adequado do filho. O João nasceu com a síndrome de Apert, e passou pela primeira cirurgia de crânio antes de completar três meses de vida. O procedimento, menos invasivo, foi realizado nos Estados Unidos.
“É uma cirurgia que você faz com cortes mínimos, com dedinhos eletrônicos, e ele voltava, como voltou pra casa no dia seguinte, tomando analgésico. E na sequência ele usaria, como usou, um capacete, por 9 meses”.
Hoje, o menino tem 6 anos.
“Está super bem, vai pra escola normal, é um excelente aluno, tem autonomia que qualquer criança de 6 anos teria, tem os amigos, a gente não tem do que reclamar.”
A craniossinostose é uma anormalidade de fusão antecipada dos ossos do crânio. Quando o bebê nasce, o crânio é feito de vários pedaços separados de ossos. Com o tempo, esses ossos se juntam para formar o crânio maduro.
A condição se caracteriza pelo fechamento precoce de suturas cranianas durante a gestação e que, em sua forma sindrômica, pode trazer comprometimentos no desenvolvimento da criança, como alterações no formato do crânio, nos olhos e visão, hipertensão intracraniana, além de prejuízo na capacidade de aprendizado. A malformação pode atingir um em cada 2.500 nascidos.
“As placas ósseas do crânio são separadas pelas suturas, que chamamos de moleirinha, e existe uma época certa para que ocorra o fechamento total e o crânio fique totalmente ósseo como é o nosso de adulto. E se isso ocorre antes, de forma precoce, esse fechamento das suturas vai de forma mais ou menos intensa prejudicar o desenvolvimento do cérebro”, explica a chefe do setor de Fonoaudiologia do Centrinho, Melissa Zatonni Antonelli.
A deformidade pode ser detectada logo após o nascimento. Geralmente os pais percebem o formato anormal da cabeça da criança. Essa malformação pode ocorrer de maneira isolada, que corresponde a maioria dos casos, ou associada a outras características, nesse caso está associada a síndromes genéticas, o que corresponde a 15% dos casos.
As síndromes de Apert, Crouzon, Muenke, Pfeiffer e Saethre-Chotzen são os exemplos mais comuns de síndromes genéticas associadas à craniossinostose.
Centro especializado
O Centrinho é referência mundial no tratamento e pesquisa de anomalias craniofaciais congênitas, síndromes associadas e deficiências auditivas. Por mês, cerca de 4 mil pacientes de diferentes estados brasileiros são atendidos no hospital. Uma média de 200 atendimentos por dia.
A Heloísa é uma das pacientes. A bebê tem 9 meses de vida e já passou por duas cirurgias de crânio. Ela também nasceu com a síndrome de Apert. A condição genética é considerada rara e se caracteriza pela fusão dos ossos do crânio e dos dedos das mãos e dos pés. Afeta a respiração, a visão e a audição.
“Foi um baque. A mãe sofreu bastante, eu também tive um impacto emocional muito grande. Ao mesmo tempo, não conhecíamos essa síndrome e não conhecíamos outras também, foi tudo muito novo. Mas a equipe que consegue acolher tanto os pais como as crianças nos trouxe muito conforto nessa hora”, conta o pai da bebê, o comerciante Ernani Aguiar.
O tratamento é a longo prazo e inclui fisioterapia, fonoaudiologia e cirurgias. A Heloisa mora com o pai em Santa Catarina e vai fazer mais um procedimento. Desta vez, para separar os dedos.
Fonte: G1