Travessia pelo corredor de brasas da fogueira acesa na festa dedicada ao santo junino é realizada há mais de 140 anos em Bocaina (SP). Entenda qual a relação do santo com a tradição da fogueira.
Quatro pessoas sustentaram a tradição centenária e atravessaram descalças o corredor de brasas da fogueira em louvor a São João, na madrugada desta segunda-feira (24), em Bocaina (SP).
Eusébio Gaspari Carbajo afundou os pés no braseiro junto da esposa. O casal mora em São Paulo (SP), mas são naturais de Bocaina e nunca haviam passado pela experiência.
“Eu respeito muito essa tradição da minha cidade, tanto que por muitos anos eu gostaria de vir, mas nunca deu certo. No ano passado teve apenas uma pessoa que atravessou, então fiquei pensando em manter viva a tradição, e minha esposa topou”, explica o aposentado.
A única pessoa que atravessou o braseiro em 2023 foi Lúcio Scarri, de 58 anos. Esta foi a 17ª vez que o fiel realizou a travessia e explica que ainda é como se fosse a primeira vez.
“É como se fosse a primeira vez. É muito grande minha fé e devoção, eu sinto a presença de São João todos os dias na minha vida depois de atravessar as brasas”, comenta.
Apesar do sucesso na travessia, Eusébio precisou ser encaminhado à unidade do Serviço de Atendimento Móvel (Samu) onde recebeu atendimento médico por queimaduras nos pés, mas segundo a corporação, passa bem.
Tradição Centenária
A estimativa da Secretaria de Turismo da Prefeitura é de que mais de 10 mil pessoas compareceram à festa que contou com quermesse, shows musicais e parque de diversões.
“Esse dia a nossa população dobra. São pessoas de todas as regiões do estado de SP e de outros estados”, explica Carlos Cunha, diretor de turismo da cidade.
Em 2024, a festa completa sua 136ª edição, levando como data inicial uma notícia de um jornal da época que anunciava a primeira celebração na praça da matriz da cidade.
Por outro lado, a celebração de São João Batista na região tem data muito mais antiga. Registros da Igreja Católica, mostram que em 1850 a festa já era realizada em fazendas de produção de café, milho e feijão na área onde futuramente se fundaria Bocaina.
Os trabalhadores rurais louvavam a grande fartura pela colheita da época que culminava com o final de junho, quando o santo é celebrado na Igreja. Os trabalhadores se reuniam na casa principal da fazenda com grande fartura de bebida e comida.
Após a festança, quando a fogueira que os aquecia era apagada, surgiu a tradição de caminhar sob a brasa da fogueira como prova de fé e devoção ao santo.
Padre Daniel Valentin, pároco de Bocaina, explica que a tradição popular foi se fundindo com a religiosa, resultando na festa como é conhecida atualmente.
“A igreja entende que é uma expressão da religiosidade popular, trazida pelos portugueses, que trouxeram também a devoção a São João Batista aqui pra cidade. Era uma maneira de expressar sua religiosidade com um ato do cotidiano”, conta o padre.
Com o passar dos anos, a quantidade de pessoas que atravessam a fogueira diminuiu. Em 2023, apenas Lúcio realizou o ato de devoção.
Padre Daniel afirma que existe um certo risco na travessia, mas que incentiva que a tradição não se perca.
“Já chegou a ter mais de 20 pessoas passando, já no ano passado, apenas uma pessoa. Então a gente motiva as pessoas a expressarem sua fé na passagem da fogueira. Mas é um risco que se corre, não é? Eu creio eu que não acaba, mas que talvez ela se transforme em outra maneira de se expressar a fé”, explica.
Fonte: G1