Enquanto o Governo do Estado de São Paulo anuncia uma nova linha de financiamento voltada à produção orgânica e agroecológica, uma área pública essencial para o desenvolvimento da agricultura regional corre o risco de ser vendida.
Trata-se da área experimental do Horto Florestal de Palmital, atualmente pertencente à APTA Regional de Assis, que figura entre as propriedades citadas pelo secretário estadual Guilherme Piaí como passíveis de alienação. A propriedade fica nas proximidades do Distrito de Sussuí.
A área, que antes pertencia ao Instituto Florestal e que é atualmente gerida pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, é caracterizada por solo do tipo terra roxa, com elevada aptidão agrícola, profundidade, textura argilosa e baixa declividade — fatores que a tornam ideal para a produção de grãos.
Segundo o pesquisador Sérgio Doná, diretor da APTA Regional de Assis, a região representa um terço das terras de baixa fragilidade do Médio Paranapanema, correspondendo a 510 mil hectares de um total de 1,65 milhão de hectares.
Atualmente, no local que tem uma área total de 72,6 hectares, incluindo 17,2 hectares de mata ciliar na Água dos Soares (afluente da Fartura), são realizados experimentos anuais de avaliação regional de cultivares de soja e milho safrinha, com foco em produtividade, resistência e adaptação às condições locais.
Os resultados dessas pesquisas são fundamentais para orientar cooperativas, produtores e técnicos da região — tanto da iniciativa privada quanto do setor público — na escolha de variedades mais adequadas, garantindo produtividade, sustentabilidade e competitividade à agricultura regional.
Além disso, a área abriga o Projeto FUNDAG, que avalia a viabilidade econômica e agronômica do sistema sucessório soja-milho safrinha de alta tecnologia em solos argilosos, com práticas de agricultura de precisão. As pesquisas envolvem desde o mapeamento da variabilidade do solo até a aplicação de técnicas de calagem, adubação e uso de cultivares adaptadas.
Para Doná, a possível venda da área comprometeria diretamente esse ecossistema de pesquisa, dificultando o avanço de projetos de desenvolvimento tecnológico voltados à realidade da agricultura regional.
“Trata-se de uma área pública com vocação científica, instalada em solos que representam a base da produção de grãos da nossa região. Perder esse espaço seria interromper uma série de estudos e entregas que beneficiam diretamente o produtor rural”, alertou.
A preocupação se acentuou com a recente publicação da Deliberação CO-08, de 14 de abril de 2025, que oficializou a criação de uma linha de crédito específica do Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista (FEAP), voltada à agricultura orgânica, agroecológica e aos produtos da sociobiodiversidade, como jussara, cambuci e pinhão, como as áreas que são de responsabilidade da Apta Regional de São Roque — e que também estão sob risco de venda.
A linha de crédito contempla produtores rurais, associações e cooperativas, incluindo aqueles em processo de transição agroecológica. Os recursos poderão ser usados para melhorias tecnológicas, aquisição de equipamentos, contratação de serviços técnicos e laboratoriais, além de ações de custeio associadas.
Os valores variam de até R$ 250 mil para produtores individuais a R$ 800 mil para cooperativas ou associações, com prazos de até 84 meses — podendo chegar a 120 meses, caso o financiamento envolva o componente florestal. As taxas de juros variam entre 2% e 4% ao ano, conforme a renda bruta anual dos beneficiários.
Para especialistas da área, há uma contradição evidente entre o lançamento de políticas públicas voltadas à produção orgânica e agrossustentável e a proposta de venda de áreas públicas que são estratégicas para o desenvolvimento científico dessas práticas.
A área experimental de Palmital é uma das poucas da região estruturadas para pesquisas em solos argilosos, justamente os mais utilizados na produção de grãos, e sua perda pode enfraquecer a base técnica necessária para orientar a agricultura sustentável no interior paulista.
Fonte: AssisCity