Sargento que fez apreensão foi advertido e ameaçado pela tenente-coronel Márcia Crystal, que recebeu ligação da vereadora Professora Daniela (PL). As ameaças foram gravadas e viralizaram nas redes sociais. Corporação informou que investiga se policial mentiu em comissão da Câmara
O sargento da Polícia Militar de Marília (SP), que se envolveu em uma polêmica em agosto do ano passado, ao guinchar o carro de uma vereadora da cidade durante uma blitz, virou alvo de um processo instaurado pela corporação.
O caso ganhou repercussão depois que a vereadora Professora Daniela (PL) ligou para a tenente- coronel Márcia Crystal, à época comandante do 9º Batalhão da Polícia Militar de Marília, na tentativa de evitar a apreensão. O sargento foi repreendido por sua comandante.
A oficial ligou para o sargento, o advertiu com falas como “o que você está achando que você é?”, e fez ameaças de transferência do policial. A conversa foi gravada e o áudio viralizou nas redes sociais.
Investigação
A Polícia Militar confirmou que foi instaurado Inquérito Policial-Militar (IPM) para investigar o comportamento do sargento Alan Fabrício Ferreira e que foi aberto um processo regular, chamado Conselho de Disciplina (CD), que pode terminar até com a exoneração do policial.
A defesa do sargento tem até esta sexta-feira (11) para apresentar sua defesa por escrito.
A Câmara Municipal abriu uma Comissão Processante (CP) para investigar a vereadora, mas o relatório final, pedindo sua cassação, foi arquivado no fim do ano passado.
Em nota, a PM diz que recebeu o requerimento informando que o “sargento faltou com a verdade na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de Marília” e que a abertura do Conselho de Disciplina vai investigar essa denúncia.
Segundo a corporação, o processo segue o rito do direito administrativo que “contempla a ampla defesa e contraditório”, ou seja, oferecerá toda oportunidade de defesa ao sargento.
O procedimento, que foi instaurado no último dia 25 de maio, deverá ser finalizado em 60 dias. Segundo a PM, “objetiva apontar se as acusações imputadas são procedentes ou não”.
Relembre o caso
A polêmica começou no dia 16 de agosto quando o carro da vereadora foi apreendido e guinchado por estar com documentos vencidos e pneus gastos, de acordo com o sargento.
Na ocasião, a vereadora ligou para a tenente-coronel Márcia Cristal, comandante do 9º Batalhão da Polícia Militar de Marília, que entrou em contato com o sargento e ameaçou trocá-lo de função caso não tivesse “bom senso” nas abordagens. Em seguida, o policial foi afastado.
Na ligação a que a TV TEM teve acesso, o policial explica que constatou que o carro da vereadora não tinha licenciamento e estava com os pneus gastos, motivo pelo qual decidiu abordar a filha dela, que dirigia o veículo, na Rua Carlos Botelho.
O policial informou, no áudio, que deu a oportunidade para que ela fizesse o pagamento via aplicativo, mas a jovem e o pai, que chegou ao local mais tarde, teriam dito que não tinham condições.
Depois de ouvir a história, a tenente-coronel pede para que o policial não ficasse “tumultuando” e diz que ele deveria ter apenas feito a orientação, sem apreender o carro.
“Porque isso daí é falta de bom senso, tá? Ela é vereadora. É, é, a condição, você pode muito bem estar fazendo e orientando, tá? E aí segunda-feira, ela pegaria o documento e não precisa apreender o veículo”, diz a tenente-coronel no áudio.
Em seguida, a comandante ameaça trocar o policial de setor se ele continuar agindo de tal maneira, já que ele teria desobedecido uma ordem superior.
“Se for desse jeito é o que eu to falando, você não vai estar mais segunda-feira no trânsito (…) porque essa aqui é uma ordem minha, você vai responder também”, continua a tenente coronel.
A conversa continua por mais alguns segundos e a tenente-coronel repete que o policial de trânsito deveria ter tido bom senso ao analisar a situação, já que a mulher é vereadora.
“Olha o que você tá causando, porque politicamente ela é vereadora. Não teve nem uma conversa, o que você está achando que você é?”, questiona no áudio.
O Comando do Policiamento do Interior da região de Bauru (CPI-4) informou que o policial que efetuou a apreensão não foi afastado, mas estava matriculado em um curso em São Paulo, agendado para o dia 24 de agosto. Por causa disso, segundo a PM, ele não iria exercer suas atividades em Marília até a conclusão do curso.
O sargento ficou em primeiro lugar no curso de Policiamento de Trânsito promovido pela corporação. Em um vídeo que circula nas redes sociais, é possível ver o momento que o segundo-sargento Alan Fabrício Ferreira é chamado para receber o troféu de 1° colocado e é aplaudido de pé pelos colegas.
Antes disso, ex-PMs também chegaram a fazer um protesto em solidariedade ao policial.
Retorno às ruas e ação do MP
O policial que recebeu as ameaças por telefone após guinchar o carro da vereadora voltou às suas funções no policiamento de trânsito que exercia nas ruas da cidade antes da polêmica.
A informação foi confirmada no dia 8 de setembro, em nota do Comando do Policiamento do Interior da Região de Bauru (CPI-4), ao qual é subordinado o Batalhão de Marília.
Na nota, a PM informa que “o militar envolvido na ocorrência reassumiu a mesma função em que se encontrava” e que seu afastamento após a polêmica se deu para que ele pudesse frequentar um curso de especialização para o qual já estava matriculado.
O anúncio do retorno do policial às ruas de Marília aconteceu no mesmo dia em que o Ministério Público abriu um inquérito para investigar um possível ato de improbidade administrativa cometido pela tenente-coronel Márcia Cristal.
Fonte: G1